quinta-feira, 11 de março de 2010

Tênis no toró 2.2

Ei!!Ei!! Dêem um rewind (aquela teclinha do DVD-player que volta a cena do filme) até “só me restou dormir mais furibundo ainda.” O Artur, testemunha ocular da história e dono de uma memória muito mais preservada que a minha, lembrou-me algo que julguei acontecer no dia seguinte.
Deram o rewind? Então vamos à versão do Artur.
Inconformado com a merda que acabara de fazer, parti em direção a um saco de goiabas e, como um louco ensandecido, comecei a sapecar as frutas nos meus inimigos de ocasião.
-- Ce tá maluco, Eritos? – berrou o Artur, cuidando de guardar o violão na capa de napa.

Sim, eu estava possesso!!! E aquela cagada de atirar o meu próprio tênis lá fora com aquele dilúvio, foi a gota d’água!!
Furibundo, mirava e acertava, à queima-roupa, nos corpos e nas cabeças de Lair, Enéas e Artur.
Meu ataque maciço durou 20 segundos, se tanto. Este foi o tempo que eles demoraram entre a surpresa e o contra-ataque.
No dia anterior catamos todas as goiabas maduras dos muitos pés que circundavam a casa. Era daquela goiaba que tem gosto e bicho. Branca, porque a nobre é a vermelha. Enchemos dois sacos de linhagem, enormes.

E eram dois sacos. Rapidamente os três lançaram mão do outro saco de goiabas. E aí tomei uma chuva dos frutos, que de tão maduros, estavam azedando. Tomei nas fuças, na cabeça, no peito esquálido, nu e suado. Tive que tirar os óculos para evitar estragos maiores. Quando estava em vias de perder o sacão de goiabas, Claudio me acudiu, levando para longge dos três o saco de goiaba e atirando contra Enéas, Lair e Artur. Rapidamente me juntei a ele e a luta das goiabas passou para o quarto, com lençóis e colchões sendo pisoteados e paredes alvejadas com os frutos. Sei que o contato corporal era inevitável e em pouco tempo Enéas e Lair estavam me imobilizando.
-- Calma, calma – gritava Enéas, apaziguador, notando que eu realmente perdera as estribeiras.
-- Calma? Como você quer que eu fique calmo? Vocês me enchem o saco, não me deixam dormir e a casa ainda é invadida por um penetra – a última frase disse olhando para o Lair.

Pronto. Melei a situação tanto quanto a guerra de goiabas. A coisa ficara séria. Enéas e Lair imediatamente me soltaram e o último estampido daquela guerra foi uma goiaba atirada pelo Cláudio que resvalou na cabeça do Enéas antes de se despedaçar em cima do sofá. Obtida através de um decreto de guerra, a paz se fez presente instantaneamente. Iluminados pela fraca luz do lampião, arrumamos nossas cantos de dormir em silêncio. Imundos, colchões, sofá e lençóis estavam coalhados e grãos de goiaba. Fomos tomar banho de chuva para limparmos um pouco dos restos de goiaba nas cabeças, e o tantão de suor com os quais encharcávamos os peitos nus. Acho que Artur e Enéas preferiram tomar uma ducha no banheiro. Não havia diferença: a água era igualmente gélida. Calados tomamos banho, calados fomos dormir. Somente o mal-estar pesava sobre nossas cabeças. Ainda imagino alguém cuspindo sementes de goiaba no breu.


O dia amanheceu esplendoroso. O quarto exalava a cheiro de goiaba; havia restos de goiaba em todo canto. As paredes, chapiscadas e brancas, estavam imundas, assim como o chão do quarto e da varanda. Tão logo tomamos café, Lair pegou as coisas dele, se despediu e partiu pela curta estradinha de terra até a Rio-Santos, que passava em frente a meia-água. Ia pegar o Pontal-Angra, de onde pegaria um ônibus para Volta Redonda.
Fui atrás ele, óbvio.
-- Lair, Lair – berrei.
Ele parou e virando, me esperou chegar até ele.
-- Cara, me desculpe pelo que falei ontem – comecei. – Tava puto com a zona que vocês estavam fazendo e disse besteira. Me perdoa.
Lair, um cabeludo, que hoje imagino imagem e semelhança do pai, careca e com um bigode colossal na época, foi polido:
--Não tem nada que pedir desculpas, Eros. Tá tudo bem. Tchau.

Lair deu uns quatro passos em direção à estrada antes de ouvir meu pedido.
-- Se está tudo bem, então porque você não fica? O fim de semana vai dar um praião... – era o convite que acho que teria que ser feito por mim ao novo integrante da trupe.
Lair cedeu e voltamos pelo caminho de terra até a casinha no Pontal.
Chegando lá rindo, fui dar buscar meu par de tênis que jazia numa poça perto do muro. Completamente esbagaçado. Tinha manchas daquela terra marrom e infértil com que aterraram o terreno onde foi erguida a casa. Eu o mostrei para a rapaziada, rindo, e segui para o tanque, onde o lavei.

Apesar do sol cáustico e convidativo, só fomos para a praia poluída por óleo e gasolina de barcos do hangar do I.C.A.R. de tarde. Passamos a manhã limpando a sala e a varanda das sementes e dos bichos de goiaba.
Cacete!! Tinha resto de goiaba até no teto. O cheiro de azedo foi atenuado com litros de Pinho Sol usados para limpar chão, móveis, paredes e bibelôs atingidos na guerra goiabal. E foi uma manhã alegre, descontraída, cheia de risadas e gozações de parte à parte, sendo eu o alvo preferido e óbvio da rapaziada.
Lá pelas 15h, fomos correndo para o clube, retornando para casa quase às 18h. Depois de um banho gelado e embebidos de litros de repelente, fomos degustar um maravilhoso miojo com molho de sardinha e tomates e matamos o resto do garrafão de Sangue de Boi, o pior vinho que já bebi na vida. O bom humor voltava a imperar e voltamos a ser um grupo.
Na mesa da cozinha, antes de sentarmos para o último jantar na meia-água daquele verão, alguém botara um copo de geléia improvisado como vaso de flor. Comovente e realmente reconciliador.

4 comentários:

  1. Muito bom reviver aqueles dias inesquecíveis através da sua narrativa clara, bem humorada e rica em detalhes.
    Lembro-me ainda, e isso seria outra história , da serenata que fizemos debaixo da janela de umas garotas que estavam hospedadas em um condomínio próximo, e o pai de uma delas apareceu e fechou as janelas bem nas nossas caras.
    Grande abraço!
    Artur

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  2. Num menti em nada não, né, Artur? embro-me que estava chateado pela presença do Lair entre nós. Inventei tudo o que não me lembrava, ou seja, quase tudo me foi ditado pela sinopse que você me passou.

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  3. sinopse... tô falando, isso é anos incríveis brasileiro. vamos tocar esse projeto, cara.

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  4. vamos fazer o seguinte. só escrecvo alguma coisa se vcoê ttopar. também pensei em pedir uma ajuda a aaaauma amiga, que é fera. se puder vir aqui sexta, talvez a grntr troque uma idéia.

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